O presidente dos EUA, Joe Biden, fez um discurso à nação nesta quinta-feira em busca do apoio da opinião pública para o financiamento americano a Israel, Ucrânia e Taiwan, além da injeção de mais recursos na fronteira do país com o México. O apelo foi feito às vésperas da Casa Branca solicitar cerca de US$ 100 bilhões (R$ 506 bilhões), segundo informações da imprensa local, ao Congresso. Na mensagem, o democrata destacou o papel do país enquanto liderança global.
— A liderança dos EUA é o que mantém o mundo unido — disse Biden. — Nós não podemos deixar terroristas como Hamas e tiranos como Putin venceram.
Em uma transmissão no horário nobre diretamente do Salão Oval, o presidente americano argumentou que “as decisões que nós tomamos hoje vai determinar o futuro das próximas décadas”, afirmando que o apoio dos EUA a aliados é uma questão de segurança nacional. Enquanto Israel simboliza a histórica narrativa americana de combate ao terrorismo, a Ucrânia representa a barreira contra o expansionismo russo herdada da Guerra Fria e Taiwan canaliza o “bastião democrático” contra a China na Ásia — este último, no entanto, não foi mencionado no discurso.
— O caos pode se espalhar para outras partes do mundo, especialmente no Oriente Médio, com Irã apoiando o Hamas — afirmou o presidente, destacando que o país está trabalhando para um “futuro melhor” na região e que isso também beneficia os EUA. — O pacote de segurança [que será enviado ao Congresso] é uma ajuda militar sem precedentes para Israel para que outros atores hostis na região saibam que Israel é forte.
O presidente americano, no entanto, enfatizou que “o Hamas não representa os palestinos”, colocando como uma vitória diplomática a abertura da fronteira de Gaza com Rafah, no Egito, para entrada de ajuda humanitária aos civis. Invocando o trauma do 11 de setembro, Biden disse ter pedido a autoridades do governo israelense — sem citar nenhuma vez o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu — que não cometesse os mesmos erros que os EUA na época levados pela “raiva”. O democrata defendeu a solução de dois Estados na região.
Em relação à Ucrânia, o presidente assegurou que não enviaria tropas americanas para a região, mas apelou para o medo do expansionismo russo, citando declarações de autoridades de Moscou sobre o suposto direito a territórios de país que são membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), como Polônia e os Bálticos — Estônia, Letônia e Lituânia.
Para Biden, o apoio do povo americano é fundamental para que a proposta seja aprovada no Congresso, em especial na Câmara dos Deputados, onde os republicanos detém uma maioria estreita. A Casa vive um cenário de incerteza desde o início do mês, quando o seu então presidente, Kevin McCarthy, foi destituído por meio de uma manobra da ala mais radical do próprio partido após ter permitido a aprovação de um projeto de lei, negociado com os democratas, que evitou a paralisação das contas públicas.
Na época, um dos pontos mais criticados pelos republicanos — favoráveis a uma política econômica mais austera — foi justamente o “cheque em branco” dos EUA à Ucrânia para se defender da Rússia. Biden pediu a liberação de US$ 24,1 bilhões (R$ 122 bilhões) ao país até o final do ano, mas o valor foi barrado do texto final. Além do cansaço em relação à guerra no Leste Europeu, que se arrasta há mais de um ano e meio sem muitos avanços na contraofensiva ucraniana, as denúncias de corrupção na alta cúpula de Kiev levantaram questionamentos sobre os custos aos cofres americanos em detrimento de pautas domésticas consideradas mais urgentes, como o aumento do fluxo migratório.
Com o amplo apoio da opinião pública americana à Israel, a estratégia do governo Biden de incluir num mesmo pacote de US$ 100 bilhões o financiamento aos seus maiores aliados facilitaria a aprovação da proposta no Congresso num momento de rara unidade entre democratas e republicanos em torno de uma mesma pauta. Da mesma forma, a inclusão de recursos para conter a crise migratória na fronteira com o México também é um aceno à oposição para frear quaisquer entraves ao pedido.
— Internamente, a decisão [de defender Israel] tem amplo apoio bipartidário e a opinião pública apoia Biden de forma esmagadora nessa questão. Há alguns na esquerda do Partido Democrata que não apoiam, mas, em geral, isso tem ajudado Biden internamente — avalia David Schultz, especialista em política americana e professor na Hamline University.
De acordo com Schultz, a viagem do líder americano a Israel após o ataque terrorista do Hamas contra o país, no dia 7 de outubro, foi bem vista pela população e pode, inclusive, beneficiá-lo internamente para as eleições presidenciais de 2024. Além da importância do eleitorado judeu para o Partido Democrata, o voto pró-Israel é forte em locais-chave na corrida eleitoral, como a Flórida, estado-pêndulo governado por Ron DeSantis, pré-candidato às primárias republicanas.